A possibilidade de penalização de menores de 18 anos pela prática de crimes considerados graves, a chamada redução da maioridade penal, está na pauta da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado Federal, nesta quarta-feira (1º). O tema tramita por meio da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 33/2012, de autoria do senador Aloysio Nunes Pereira (PSDB-SP). Enquanto não há uma definição, o tema divide opiniões de advogados.
Para o advogado Victor Naves, por exemplo, reduzir a maioridade penal é um retrocesso de garantias dos direitos da criança e do adolescente. Ele explica que a proposta objetiva alteração de dispositivos da Constituição Federal (CF) para possibilitar a desconsideração da inimputabilidade penal de maiores de 16 anos e menores de 18, por meio de lei complementar. “A medida não apenas propõe submeter adolescentes ao sistema penal tradicional, notoriamente falho, como viola tratados de direitos humanos assumidos pelo Brasil em âmbito internacional, como a Convenção sobre os Direitos da Criança e do Adolescente da Organização das Nações Unidas (ONU)”, destaca.
Naves salienta também que as infrações cometidas por jovens de 16 e 17 anos não podem ser tratadas como uma questão de segurança pública, pois esta realidade, ao contrário, revela restrição de acesso a direitos fundamentais. Neste contexto, ele argumenta que crianças e adolescentes são ainda as maiores vítimas de violência no Brasil. “Com a nossa atual realidade prisional, que é de superlotação, encarcerar adolescentes será o mesmo que colocá-los em contato direto com o crime organizado”, pontua.
O advogado informa que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) já prevê a responsabilização adequada para crianças e adolescentes que cometem infrações. “Reduzir a maioridade penal não reduzirá a violência. Os dados sobre crimes cometidos por esses jovens não revelam a necessidade de uma proposta que os submeta ao encarceramento, mas sim de políticas públicas que os conduza para um melhor acesso à educação”, arremata.
Impunidade majorada
Também contra o projeto, o advogado Victor Hugo de Castro diz que a redução da maioridade penal não trará a sensação de segurança tão almejada pela sociedade. Nem tampouco afastará a impunidade. Aliás, ele ressalta que essa impunidade poderá até ser majorada, tendo em vista o atual contexto social no Brasil. Isso porque, segundo analisa, o problema da criminalidade crescente entre os menores de idade não deriva diretamente da pretensão punitiva do Estado – ou à falta da sua aplicação -, mas da ausência de educação, saúde e empregos de qualidade, até mesmo do direito ao lazer, entre outros tantos direitos constitucionais.
Nesse contexto, conforme diz o especialista, é fácil de observar que o problema da criminalidade no Brasil, sobretudo entre os jovens, é uma patologia congênita da sociedade em razão da omissão Estatal. “Sabemos que a personalidade de cada pessoa, voltada para o crime ou não, depende muito do contexto social em que o indivíduo está inserido. Se analisarmos estatisticamente, podemos constatar que a incidência maior de jovens infratores vem das periferias e dos locais onde se tem menos oportunidades de um modo geral, sem contar o preconceito racial que agrava ainda mais o problema”, ressalta.
Assim, conforme diz o advogado, o menor de idade de baixa renda que já vive no meio da marginalidade, sem escola de qualidade, sem saúde, e que integra uma família que não tem o mínimo de condições de se manter com dignidade, tem muito mais chances de ser atraído para o crime do que o menor que tem um padrão de vida razoável. Para ele, cabe ao Estado investir cada vez mais em segurança pública, talvez como medida imediata ao controle da marginalidade entre os menores. Mais do que isso, mirar as bases da sociedade como prioridade de governo. “Para que então, quem sabe, a longo prazo, as próximas gerações possam ter uma boa formação, bem estar social e oportunidades”, salienta.
A favor
Já o advogado Flávio Corrêa Tibúrcio se posiciona a favor da redução da maioridade penal para 16 anos. Segundo ele, o estabelecimento de uma idade mínima para a responsabilização penal leva em conta o grau de discernimento da pessoa. O especialista explica que, quando do início da vigência do Código Penal, na década de 40, o acesso dos adolescentes à educação e mesmo à informação era tímido, impossibilitando-os de terem um grau de conhecimento apto a divisar as consequências da prática de crimes. Mas hoje, segundo diz, os tempos são outros.
“O grau de evolução de um adolescente de 16 anos é capaz de atestar sua plena capacidade de entender o quão reprovável é determinado comportamento criminoso”, declara. O advogado observa, também, que, ainda que se defenda que crimes cometidos por adolescentes sejam apenas 10% do total dos cometidos no país, o fato é que esse percentual já é relevante. “Um único homicídio é uma ruptura à paz social”, acrescenta.
Tibúrcio diz que o Estatuto da Criança e do Adolescente não se mostrou eficaz na prevenção e no combate à criminalidade dos que a ele se sujeitam. Porém, ele diz que, por outro lado, é evidente que a segregação conjunta de adolescentes e adultos pode ser extremamente prejudicial aos primeiros, na medida em que poderia até mesmo aumentar a reincidência. “Medidas como a separação entre adultos e adolescentes, o estímulo à reeducação no cárcere e ações de desestímulo à criminalidade seriam muito bem-vindas nesse novo cenário, uma vez aprovada a redução da maioridade penal”, completa.